Capa de Al Milgrom.
Uma das raras vezes em que a arte interna é muito superior a da arte da capa.
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SASQUATCH!
Em The Incredible Hulk Annual nº8 (Marvel, 1979) e no Brasil, no Almanaque do Incrível Hulk nº 1 (RGE, 1980) foi publicada Sasquatch! uma das 10 melhores histórias do personagem que já tive o prazer de ler. A crítica a seguir contém mega-spoilers. Leia por sua conta e risco.
Na história escrita por Roger Stern e John Byrne, um astro em ascenção na Marvel, Hulk cai do espaço em uma remota floresta do Canadá. Salvo por uma mulher, Maureen, de morrer sufocado na cratera aberta por sua queda, Hulk acorda com seu mau-humor habitual e machuca sua salvadora. Apavorada, Maureen é poupada somente porque Hulk finalmente entende que ela na verdade o salvou. E também porque Hulk é o herói da história e nos anos 70 não lhe permitido aos roteiristas matar inocentes, nem mesmo quando Hulk arrasava cidades inteiras.
Ferida, Hulk a leva de volta para sua cabana na floresta. Lá, a criatura se acalma e volta ser Bruce Banner. Depois de mais um choque causado pela aparição de Banner, a mulher sai para procurar seu gato e deixa Banner sozinho na cabana. Contemplando uma espingarda, Banner reflete seriamente sobre a possibilidade de cometer suicídio. O desespero e a falta de esperança causado pela incapacidade de conter a raiva de seu ID, pelo que me lembro, só seria abordado com mais profundidade novamente na mini Banner, de Azzarello e Corben da qual já falei aqui.
Enquanto isso, a queda do Hulk em solo canadense não passou desapercebida e os militares enviam Sasquatch, um agente da recém-criada (Claremont e Byrne) Tropa Alfa, para neutralizar o Hulk. Movido pelo ego e para não fugir do clichê heróis-brigam-quando-se-encontram, o cientista Walter Langkowski/Sasquatch aceita a missão para testar sua força contra o Hulk. Ego contra ID.
Banner:
"Mas existe um meio de curar isso, não?
Uma forma rápida de deter o Hulk para sempre.
Porque não? Um tiro... Sem dor... Sem sentir nada.
Agora, antes que eu..."
Após uma entrada dramática e assustadora para Maureen e Banner, Sasquatch explica seus motivos enquanto Banner tenta dissuadi-lo de sua arrogância. Como não sobra mais uma vida real para o personagen de Banner, parece que só seu Superego sobrou, tentando a todo custo frear as paixões, a violência e a raiva que podem liberar seu ID incontrolável. Mas como o personagem trágico que é, Banner novamente se transforma em Hulk após quase ser morto por Sasquatch em sua tentativa de provocar a metamorfose.
Nesse ponto entram em ação as linhas dinâmicas do ilustrador tradicional do Hulk, Sal Buscema, mas dessa vez auxiliado pelo tinta sombria de Alfredo Alcala (arte-finalista habitual de John Buscema em diversas aventuras de Conan). Sal entrega uma sequência de ação brutal que entrou para os anais das melhores sequências de lutas do Hulk até hoje e Alcala garante um realismo às expressões de ódio do monstro como nunca havia se visto até aquela época.
A única ressalva que faço quanto a sequência de batalha é a velha mania
que os roteiristas da Marvel tem de adicionar diálogos durante os golpes.
Com um impulso homicida e diálogos raivosos no estilo "Como a luta pode acabar se você ainda está vivo?", essa foi a primeira aventura que li do Hulk (das centenas das publicadas nos anos 60 e 70), onde seu instinto assassino é aprofundado. E a história é tão bem conduzida nessa questão que, pela primeira vez, acreditamos que o Hulk pode matar.
As últimas páginas resumem magistralmente os anos da tragédia que se tornou a existência de Banner/Hulk, quando enlouquecido pela raiva, percebe o pânico mortal que Maureen sente dele. Súbito, a ficha cai e o Superego de Banner entra em cena forçando o Hulk a desistir da violência, forçando-o a entender a morte de uma conexão real com outro ser humano, forçando-o a desistir de ser amado.
Se esquecermos por um instante as milhares de histórias bobas passadas e presentes escritas com a personagem do Hulk e focarmos apenas no que foi contado nesse pequeno épico dramático em particular, perceberemos que estivemos diante de um daqueles raros momentos em que os quadrinhos de super-heróis extrapolam seus objetivos originais de mero entretenimento superficial e se tornaram literatura de qualidade.
Capa da edição nacional que contém a história.
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