Eu deveria ter nove anos quando aconteceu a primeira vez. Após essa, seguiram-se centenas de outras, sendo que talvez a primeira centena tenha sido praticamente igual. Eu corria na calçada em frente à minha casa e após alguns metros me atirava no ar como se para dar um mergulho. Mas não havia piscina, apenas o chão de laje dura o qual meu corpo jamais tocava. Pois milímetros antes de tocar o chão, eu parava no ar, e levitando, ia subindo e avançando em câmera lenta pela rua vazia até chegar a altura da copa das árvores.
Alguns anos depois, encontrava-me em uma rua escura e mal iluminada com alguns amigos. Súbito, por um motivo fútil qualquer, decidi parar de caminhar e ergui-me alguns metros do chão ficando a companhar meus assombrados amigos pela altura dos postes. A partir dessa época comecei a adquirir um controle cada vez maior sobre isso. Diferentemente da minha infância, quando parecia ser levado pelo vento ou seja lá o que fosse, eu descobri que com um pensamento a lei da gravidade deixava de existir para mim e que com leves inclinações do meu corpo conseguia mudar a direção, não ficando mais limitado a voôs retos. Até mesmo a altura e a velocidade que eu conseguia atingir eram agora comparáveis as de qualquer jato. As cidades tornavam-se pontos de luz e o horizonte arredondava-se, mostrando a curvatura do planeta. Os supersônicos rasantes entre os prédios da cidade eram tantos que mal conseguia enxergar por onde estava indo.
Desse modo, como um deus, eu flutuava, voava, disparava pelos céus até que o míssil-despertador me acertasse, fazendo-me despencar pesadamente na cama.
E assim, sentindo o peso da mortalidade espalhar-se por meu corpo e mente, eu me levanto colocando os pés no chão frio e vou ao banheiro escovar os dentes.
Junho, 1999
otimo conto!
ResponderExcluirinfelizmente,nós colicados,não temos sonhos taõ bonitos,estamos mais para sonhos psicodelicos.
xDDD
beijo*)